Hora do almoço
Belchior
No centro da sala,
diante da
mesa,
no fundo do prato,
comida e tristeza.
A gente se olha,
se toca e se cala
E se desentende
no instante em que fala.
Cada um guarda mais o seu segredo,
sua mão fechada
sua boca aberta
seu peito deserto,
sua mão parada,
lacrada,
selada,
molhada de medo.
Pai na cabeceira: É hora do almoço.
Minha mãe me chama: É hora do almoço.
Minha irmã mais nova, negra cabeleira...
Minha avó me chama: É hora do almoço.
... E eu inda sou bem moço
pra tanta tristeza.
Deixemos de coisas,
cuidemos da vida,
senão chega a morte
ou coisa parecida,
e nos arrasta moço
sem ter visto a vida
ou coisa parecida aparecida
Naquela mesa
Sérgio Bittencourt
Naquela
mesa ele sentava sempre
E me dizia sempre o que é viver melhor
Naquela mesa ele contava histórias
Que hoje na memória eu guardo e sei de cor
Naquela mesa ele juntava gente
E contava contente o que fez de manhã
E nos seus olhos era tanto brilho
Que mais que seu filho
Eu fiquei seu fã
Eu não sabia que doía tanto
Uma mesa num canto, uma casa e um jardim
Se eu soubesse o quanto dói a vida
Essa dor tão doída, não doía assim
Agora resta uma mesa na sala
E hoje ninguém mais fala do seu bandolim
Naquela mesa ta faltando ele
E a saudade dele ta doendo em mim
Naquela mesa ta faltando ele
E a saudade dele ta doendo em mim
Garçom
Reginaldo Rossi
Garçom! Aqui!
Nessa
mesa de bar
Você já cansou de escutar
Centenas de casos de amor...
Garçom!
No bar todo mundo é igual
Meu caso é mais um, é banal
Mas preste atenção por favor...
Retrato marrom
Rodger Rogério • Fausto Nilo
Ai meu coração sem natureza
Vê se estanca essa tristeza que ilumina o escuro lar
O nosso amor é um escuro lar
Suspiro azul das bocas presas
O medo em minha mão que faz tremer a tua mão
Transpassa o coração, joga fumaça em meu pulmão
Silente esquina no Brasil
Nos verdes mares, calma lama, num desespero sem canção
Guarda o teu olhar de ave presa
Na toalha de uma
mesa
Sem mirar a luz do sol, não há calor na luz do sol
O fim da festa é uma certeza
Te vejo em minha vida como um retrato marrom
São lembranças perdidas de um passado, e tudo bom
Brilha um punhal em teu olhar
Sinto o veneno do teu beijo
Era moderno o meu batom, batom, batom, batom ...
Matança
Xangai • Jatobá
Cipó caboclo tá subindo na virola
Chegou a hora do pinheiro balançar
Sentir o cheiro do mato da imburana
Descansar morrer de sono na sombra da barriguda
De nada vale tanto esforço do meu canto
Pra nosso espanto tanta mata haja vão matar
Tal mata Atlântica e a próxima Amazônica
Arvoredos seculares impossível replantar
Que triste sina teve cedro nosso primo
Desde de menino que eu nem gosto de falar
Depois de tanto sofrimento seu destino
Virou tamborete
mesa cadeira balcão de bar
Quem por acaso ouviu falar da sucupira
Parece até mentira que o jacarandá
Antes de virar poltrona porta armário
Mora no dicionário vida eterna milenar
Nada de novo
Paulinho da Viola
Papéis sem conta
Sobre a minha
mesa
O vento espalha as cinzas que deixei
Em forma de poemas antigos
Relidos
Perdido enfim confesso
Até chorei
Nada mais importa
Você passou
Meu samba sem razão
Se acabou
Um sonho foi desfeito
Alguma coisa diz
Preciso abandonar
Os versos que já fiz